Melhoramento genético amplia fronteiras do etanol de segunda geração

Prof. Gonçalo de jaleco, sorrindo em frente à equipamentos do laboratório
Tecnologia desenvolvida por pesquisadores do Instituto de Biologia da Unicamp regula a expressão de genes

Texto: Kátia Kishi    |     Foto: Adriana Pavanelli

O Brasil vai passar a produzir entre 47 bilhões e 50 bilhões de litros de etanol por safra até 2028. Um aumento de cerca de 50%, frente aos 33 bilhões produzidos atualmente. A previsão é da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), que credita o crescimento ao RenovaBio, política nacional de estímulo à adoção de biocombustíveis, voltada para o cumprimento dos compromissos de redução de emissão de gases de carbono no âmbito do Acordo de Paris.

Para atender a esta previsão, a evolução da política pública de estímulo aos combustíveis renováveis não deixa de ser acompanhada do desenvolvimento continuado, nas Instituições de Ciência e Tecnologia Nacionais (ICTs), de tecnologias voltadas para a melhoria genética da cana-de-açúcar. Na Unicamp, este é objeto de estudo de um grupo de pesquisa liderado pelo professor Gonçalo Pereira, do Instituto de Biologia (IB). Entre os resultados obtidos pelo grupo está um know-how sobre uma série de promotores genéticos, região do DNA que inicia a transcrição de um determinado gene para determinar precisamente como e em que área da planta, especialmente nas variedades de cana-de-açúcar, ele deve se expressar para atingir algum tipo de melhoramento genético. Segundo o docente, isso é possível porque, com a expressão correta desses genes nos locais desejados, a planta pode se fortalecer contra pragas e doenças, além de outras tantas melhorias genéticas que se desejar como o aumento de produção de açúcar.

Para entender melhor como funciona esse processo, o docente usou a metáfora de que a cana seria uma casa que tem em sua entrada um painel com vários interruptores de circuitos que acendem e desligam lâmpadas diferentes, sendo que cada interruptor aciona somente um circuito para acender ou desligar uma lâmpada. Na analogia, o gene seria esse circuito (com interruptor e lâmpada), no qual o promotor é o interruptor que aciona o circuito e a parte codante do gene, “o que realmente faz o trabalho”, a lâmpada. Para ligar ou desligar uma lâmpada (fazer o gene “funcionar”), é necessário acionar o interruptor correto do circuito que se deseja, ou seja, o promotor.

“Vamos dizer, que um desses circuitos, uma dessas lâmpadas, está no banheiro dessa casa. Quando você chega em casa querendo ir ao banheiro e está tudo escuro, você precisa ligar uma lâmpada que está no banheiro. Mas se você aciona o interruptor errado, como o da lâmpada da geladeira na cozinha, não vai adiantar para o que você quer porque você terá que usar o banheiro no escuro. Nessa analogia, o que descobrimos em nosso trabalho foi uma série de interruptores e suas conexões”, exemplifica Pereira sobre a descoberta.

Com o potencial biotecnológico em permitir a expressão de determinados genes de cana em tecidos de interesse, bem como determinar o melhor momento para que essa expressão aconteça que a BioCelere, Centro de Pesquisas em Biologia Sintética da GranBio, licenciou a tecnologia, justifica Angela Drezza, especialista em propriedade intelectual da GranBio, ao complementar que é de interesse da empresa desenvolver novas variedades de cana-de-açúcar para produção de biocombustível, em especial, o etanol de segunda geração (cuja matéria-prima é a variedade cana energia), bioquímicos e outros produtos renováveis da forma mais sustentável possível.

No momento, a tecnologia está em fase de validação e não há data prevista para o início da comercialização. No entanto, Drezza adianta que já obtiveram resultados promissores nos testes para induzir a expressão dos genes em variedades da cana, otimizando o desenvolvimento com mais agilidade: “Isso é importante porque, no desenvolvimento de variedades vegetais, o tempo de cada safra é muito relevante. Assim, a expressão de determinados genes de interesse no momento mais conveniente, possibilita acelerar etapas de desenvolvimento da variedade vegetal, permitindo um ganho de competitividade para a empresa”.

Originalmente publicado no Jornal da Unicamp.