Cogumelo é usado para desenvolver clareadores dentais naturais

Foto colorida mostra em primeiro plano um talo de cogumelo shimeji de cor marrom e bege. Ele está sobre uma bancada branca de laboratório e ao fundo estão dispostos cinco recipientes de vidro contendo o extrato em diversas fases: sólida e semissólida. Fim da descrição
A empresa spin-off da Unicamp, WeBee, licenciou tecnologia que aplica o extrato de  cogumelo shimeji em nova geração de clareadores dentais mais sustentáveis e com menos efeitos adversos.

Esta reportagem compõe a série Prêmio Inventores | Texto: Ana Paula Palazi | Foto: Pedro Amatuzzi – Inova Unicamp

A formulação inovadora para produção de clareadores dentais naturais a partir do extrato da coroa e talos de cogumelos comestíveis do tipo shimeji foi desenvolvida com o resultado de pesquisas conduzidas na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) em parceria com a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A invenção permitirá que o tratamento para remoção de manchas nos dentes seja feito de forma natural, sem o uso de produtos químicos abrasivos, e com menos efeitos adversos do que os métodos disponíveis no mercado.

A tecnologia é resultado de um estudo interdisciplinar que envolveu pesquisadores de três Faculdades da Unicamp – Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF), Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) e Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP) – e da Unifesp. O método com patente depositada possibilita o reaproveitamento de partes descartadas na produção de cogumelos, reduzindo a geração de resíduos da indústria. Por outro lado, gera valor à cadeia produtiva ao dar um destino nobre para partes que iam para o lixo.  

“O clareador dental à base de extrato de shimeji foi desenvolvido pensando na sustentabilidade que mantém o tripé ambiental, econômico e social. Podemos dispor de uma quantidade grande de matéria-prima de baixo custo sem precisar, por exemplo, aumentar a produção de cogumelos, e com apoio aos pequenos produtores que se beneficiariam da agregação de valor de um resíduo”, avalia Juliano Lemos Bicas, professor da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp. 

O invento protegido com estratégia da Agência de Inovação Inova Unicamp foi licenciado, em 2021, para a startup Webbe, uma spin-off acadêmica da Unicamp, empresa nascente que tem como atividade principal o resultado de uma pesquisa ou conhecimento gerado na Universidade. A startup foi criada pela biotecnologista e empreendedora em série, Dayse Alexia e tem como objetivo acelerar a criação de produtos comercialmente viáveis em um modelo de negócios escalável a partir da propriedade intelectual protegida da Unicamp.

Mercado aquecido

O clareamento dental é um dos procedimentos clínicos mais utilizados nos consultórios odontológicos e a procura por produtos “amigos da natureza” tem se intensificado nos últimos anos. O diferencial da tecnologia da Unicamp está na forma natural de clareamento que tem potencial para reduzir reações adversas, como irritação na gengiva, na mucosa oral ou a sensibilidade temporária dos dentes, quando comparada com as tecnologias existentes no mercado.

A invenção também não exige o uso de substâncias isoladas, que requerem processos mais complexos e caros de produção. O extrato usado para o clareamento é obtido do chapéu ou do talo do cogumelo shimeji (preto e branco) e requer apenas o cogumelo com um mínimo de tratamento, sendo considerada uma tecnologia “verde”.

A professora e pesquisadora da Faculdade de Odontologia, Débora Alves Nunes Leite Lima, explica que as técnicas de clareamento dentário mais usadas, que levam peróxidos de hidrogênio e de carbamida na composição, já removem os pigmentos sem alterar a estrutura dental. No entanto, esses produtos ainda podem causar algumas alterações do esmalte em termos microscópicos como a desmineralização dos dentes.

O processo é reversível pela salivação e aplicação de flúor, mas se o paciente fizer uso de medicamentos que baixam o fluxo salivar, essa capacidade de remineralização do esmalte pós-clareamento pode sofrer interferências. 

“O agente clareador do cogumelo vem numa frente ainda mais conservadora para o esmalte dental, na qual todos os pacientes poderiam ser beneficiados, principalmente aqueles que apresentem alguma alergia e sensibilidade às outras formulações ou que façam uso de medicação que interfira no processo, como é o caso de alguns remédios para ansiedade”, comenta a professora Débora Alves Nunes Leite Lima

Foto colorida mostra três mulheres e um homem em ambiente de laboratório. Uma das mulheres é afrodescendente e as demais são brancas e loiras. O homem também é branco de cabelos castanhos. Todos vestem jaleco e seguram nas mãos recipientes de vidro contendo o extrato de cogumelo usado como clareador dental. Fim da descrição.

A empreendedora Dayse Alexia, Profa. Gislaine Ricci Leonardi, Profa. Débora Alves Nunes Leite Lima e Prof. Juliano Lemos Bicas (esq.para dir.)

Mecanismo de ação

O cogumelo apresenta diversas enzimas conhecidas da literatura científica por suas propriedades despigmentantes. Segundo Gislaine Ricci Leonardi, professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF), o mecanismo de ação do extrato ainda não foi totalmente esclarecido, mas os resultados dos estudos conduzidos, até o momento, na Unicamp indicam a existência de uma explicação que vai além dessas enzimas. 

“Testamos diferentes cogumelos de supermercado e percebemos que o shimeji do tipo preto é o que funciona melhor. Descobrimos que quando o cogumelo é aquecido, antes do tratamento, ele tem uma ação de clareamento superior. Isso sugere que o efeito clareador pode não estar ligado às enzimas, mas seguimos na pesquisa para saber o que produz esse efeito”, complementa Gislaine Ricci Leonardi.

O extrato de cogumelo foi considerado seguro nos testes laboratoriais feitos in vitro (em placas) e em amostras de blocos dentários bovinos doados à pesquisa. O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Unicamp. O próximo passo da pesquisa prevê testagens de concentração e aplicação técnica para que o clareador à base de cogumelo shimeji possa seguir para a fase de testes clínicos em humanos.

A Webee pretende testar o produto em três formulações diferentes: um gel para clareamento com uso de moldeira para os dentes, um creme dental e um enxaguatório bucal. Para avançar no desenvolvimento do modelo comercial, a empresa-filha da Unicamp vai contar com recursos do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP.

“Estamos finalizando os trâmites burocráticos para avançar no processo. Vemos um potencial muito grande nessa tecnologia. Os resultados de clareamento são muito próximos aos dos tratamentos atuais, mas com potencial redução de impacto no meio ambiente e maior conforto para os pacientes a partir do uso de um produto 100% natural”, diz a fundadora da Webbe e pesquisadora responsável do projeto com o PIPE, Dayse Alexia.

O modelo de licenciamento via spinoff

O licenciamento de uma tecnologia para uma empresa nascente – via spin off-  é um dos modelos adotados pela Inova Unicamp. Este processo demanda capacidade em estabelecer uma comunicação diferenciada com as empresas, que, em sua maioria, detém o domínio técnico da tecnologia, mas, precisam de apoio para análise do modelo de licenciamento a ser adotado. 

“A comunicação assertiva entre pesquisadores, a Inova Unicamp e a empresa foi fator fundamental para a concretização do licenciamento, pois propiciou a cada parte o entendimento e o atendimento das expectativas. Este modelo nos aproxima ainda mais da empresa. Constantemente somos demandados para acompanhamento da trajetória do desenvolvimento da tecnologia. A proximidade com os inventores é uma via de mão dupla: todos aprendemos”, disse Iara Ferreira, diretora de Parcerias da Inova Unicamp. 

Prêmio Inventores 2022

Inventores premiados neste licenciamento:

Profa. Gislaine Ricci Leonardi (FCF Unicamp), Maria Cibelle Pauli (UNIFESP), Prof. Juliano Lemos Bicas (FEA Unicamp), Profa. Débora Alves Nunes Leite Lima (FOP Unicamp), Prof. Rodrigo Ramos Catharino (FCF Unicamp) foram premiados na categoria Propriedade Intelectual Licenciada no Prêmio Inventores 2022.

Spin-off homenageada:

A WeBee nasceu com o objetivo de criar soluções em negócios sustentáveis que impactem o mundo com tecnologia, diversidade e empoderamento. Inspirada nas abelhas que são colaborativas e organizadas, elas mostram que mesmo pequenas são numerosas e geram impacto positivo em todo ecossistema.

Programação de homenagens

Essa matéria faz parte da série de reportagens produzida pela Inova Unicamp sobre algumas das tecnologias licenciadas, que podem ser lidas pelo site da Inova e também em formato ebook na Revista Prêmio Inventores (com lançamento previsto para junho). Também já está agendado um webinar com conteúdo sobre propriedade intelectual e transferência de tecnologia para o dia 08 de junho (inscrições abertas ao público geral).

Confira todos os premiados no site do Prêmio Inventores da Unicamp.

Os patrocinadores do Prêmio Inventores 2022 são: ClarkeModet; 3M; Neger Telecom; Pulse Hub