Sobram recursos para investir, mas ainda faltam projetos qualificados

Hoje há mais recursos disponíveis para investir em inovação do que projetos qualificados para recebê-los. Essa é a opinião unânime de gestores de fundos de venture capital especializados em identificar oportunidades entre as micro e pequenas empresas com alto potencial de crescimento. Nos últimos cinco anos, pipocaram novos fundos constituídos com dinheiro público e privado para investir em capital de risco. A maioria formado por profissionais que querem multiplicar os recursos de seus fundos identificando projetos inovadores e escaláveis no mercado em que atuam.

“Se o Brasil, por um lado, sofre em não ter volume de desenvolvimento de novas tecnologias e em copiar e adaptar muitas versões de startups estrangeiras, por outro, desponta em seus centros de excelência, incubadoras e aceleradoras que, além de ajudar o empreendedor, avançam com o conceito de inovação aberta”, afirma Humberto Matsuda, sócio da Performa Investimentos, gestora que administra RS 200 milhões em dois fundos de venture capital.

Apesar de estarmos engatinhando, o fato é que no quesito inovação, as empresas de menor porte saem na frente das grandes, na opinião de Francisco Jardim, sócio fundador da gestora SP Venturas. “Apesar da dificuldade em encontrar projetos consistentes, é certo que as micro e pequenas têm uma capacidade maior de inovar e com mais desenvoltura do que grandes, que demoram e não conseguem fazer mudanças radicais”, afirma Jardim, que é também gestor responsável pelo fundo Criatec, criado em 2009 pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) em parceria com o Banco do Nordeste para fomentar inovação em empresas que faturem até R$ 6 milhões.

Em quatro anos, investiu R$ 25 milhões em oito empresas com alto potencial de crescimento e está estruturando um terceiro fundo, que será lançado em até 90 dias, e terá R$ 100 milhões para aplicar em inovação médica, agrícola, biotecnologia e nanotecnologia.

O maior desafio ao empreendedor é descobrir como se tornar atraente para ter acesso a esse tipo de capital. “Tem que ter inovação genuína, difícil de ser copiada. E um empreendedor talentoso, difícil de ser substituído”, indica Juliano Seabra, presidente do Instituto Endeavor do Brasil. Mas é preciso mais do que isso.

Pensar grande, em como turbinar seus negócios além das fronteiras regionais e nacionais e mostrar que aquela tecnologia tem potencial relevante no mercado onde quer entrar. “Isso porque o capital de risco sabe que metade (ou mais) das empresas que tem no portfólio vai morrer. Então, quem der certo, tem que compensar”, avalia Jardim. Para que isso aconteça, a inovação tem que ser percebida como algo que vai melhorar a vida do usuário e ser endereçada a uma grande massa de pessoas, porque os fundos vão se interessar por esse potencial de crescimento.

Gladys Mariotto, criadora do site 'Já Entendi', diz estar pronta e ter todos os requisitos necessários para receber esse tipo de recurso. Com doutorado em educação pela Universidade Federal do Paraná, desenvolveu um novo método de ensino voltado a alunos do ensino médio, na fase pré-vestibular, que tenham dificuldade de concentração. O método, premiado no Desafio Brasil de 2012, da FGV, foi exibido na Universidade de Harvard e esteve entre os três melhores do concurso mundial de empreendedorismo no Japão.

Gladys também foi convidada a exibir e explicar a nova metodologia à Unicef. Ao todo são 27 prêmios em dois anos, sendo 10 internacionais. “O que chamou atenção de tanta gente é que, em testes realizados em meu doutorado, com 600 pessoas, os vídeos se mostraram ainda mais eficientes. Além de ajudar no déficit de atenção, aceleram o conhecimento “. Por meio de aplicativos on-line, Gladys abriu a Já Entendi no ano passado como empresa incubada na Federação das Indústrias do Estado do Paraná.

Hoje possui mais de mil vídeos-aula de um a cinco minutos, mil assinantes e 5 mil pessoas cadastradas. O próximo passo é aplicar a tecnologia em treinamento corporativo. O que falta agora é investimento para crescer. “Já fomos procurados por três fundos de venture capital e eu não aceitei, pois não tinham nenhum vínculo com a educação”.

Gladys se orgulha por ter sido localizada no começo do ano pelo Gera Venture, fundo do empresário Jorge Paulo Lemann ligado à educação, e pela Trindade Investimentos, com o mesmo foco. “Eles ficaram animados e me pediram para enviar um relatório a cada dois meses, mostrando a evolução dos negócios”.

Em fase bem mais embrionária de seu projeto, que só existe no papel, a Gloriosos é uma startup que surgiu em agosto do ano passado após Thierry Cintra Marcondes e mais três colegas do curso de engenharia ganharem o prêmio final do Desafio Unicamp de 2012, competição de modelo de negócios e patentes: R$ 3 mil para cada participante, mentoria e incubação da futura empresa por até três anos. O projeto que apresentaram foi um sensor de alta sensibilidade para detectar combustível adulterado, sua viabilidade técnica e de mercado.

“Desenvolvemos um hardware para interpretar as informações de maneira didática e acessível. Já temos um protótipo em testes, com bons resultados. Mas ainda faltam alguns ajustes técnicos, calibração e escutar o que e como o mercado quer desse produto, para poder oferecer a melhor proposta de valor, com as especificações técnicas desejadas. O produto final deve estar pronto em outubro deste ano”, afirma Marcondes. O foco da Gloriosos é o mercado automobilístico. O objetivo é que o sistema seja instalado nos carros já na fábrica ou vendido direto ao consumidor a um preço sugerido de R$ 150. (RL)

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